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Super under pressure

  • Foto do escritor: Michelle Ramos
    Michelle Ramos
  • 18 de ago. de 2019
  • 3 min de leitura

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Nesses tempos de filme do Queen (mais fácil de pronunciar que Bohemian Rhapsody), vou começar a história por essa música. Ela foi uma produção conjunta com David Bowie, depois de uma gravação que restou frustrada. Bowie não gostou dos vocais dele e pediu que a música não fosse lançada. Mas ele não desistiu de fazer algo com seus conterrâneos. Numa jam entre os músicos eles criaram Under Pressure. Bowie escreveu a letra praticamente sozinho. Durante a mixagem os músicos brigaram e Bowie ameaçou impedir o lançamento da música. Assim a música saiu. Sob pressão.


Sob pressão eu havia feito a primeira e única apresentação artística em minha vida. Eu tinha 7 anos, 9 talvez... A memória nos trai. Freud diz que os histéricos sofrem principalmente de reminiscências. Essa lembrança me perseguia até hoje. Éramos 40 crianças dançando em pares. O começo da dança consistia em duas fileiras, uma de frente para a outra. Quando a música tocasse todos teríamos que ir dois passos pra direita, dois para a esquerda, e andaríamos para frente e nos encontraríamos com nossos pares. Eu era a primeira da fila, deveria puxar o movimento. Mas eu vim sem o aplicativo de lateralidade instalado. Nunca sei qual a direita e qual a esquerda. Estávamos nos apresentando numa quadra de esporte do SESI, praticamente um estádio para uma criança. A música começou e eu puxei minha fileira pro lado errado. Resultado: metade me seguiu, metade foi pro lado certo, todos nos trombamos. A música parou. A professora entrou na quadra, ajeitou todo mundo e esperou a música tocar pra me puxar pro lado certo. Só isso ficou na minha memória. Não sei como foi meu desempenho no restante. Simplesmente se apagou. Menos esse fracasso.


Poucos sabem, mas Freud começou seus estudos sobre a mente humana como um neurologista. Oliver Sacks conta essa história no livro O Rio da Consciência. Ele diz em determinado trecho que Freud acreditava que "nada era mais fundamental para a formação da identidade do que o poder da memória, nada mais garantia a continuidade de uma pessoa como indivíduo. Mas memórias mudam, e ninguém foi mais sensível que Freud ao potencial reconstrutor da memória, ao fato de que as memórias são trabalhadas e revistas continuamente, e de que sua essência, na verdade, é a recategorização." Em outras palavras significa que a memória vai se rearranjando com o tempo, como se a história da nossa vida fosse sendo reescrita quotidianamente.


Essa minha história da apresentação foi reescrita na última quinta-feira. Aos 40 anos, mais de trinta anos depois, meus neurônios ressignificaram essa história, como numa sessão de terapia. Em meio ao medo da repetição do fracasso, do medo do vexame, do medo do julgamento da plateia, eu resolvi enfrentar esse fantasma. E descobri que a Michelle de hoje é mais forte, mais confiante, mais corajosa que a pequena Michelle de 7 anos. Estava com as duas pernas machucadas. Receosa. Mas eu fui. Minha performance não foi incrível. Mas abrir a porta dessa gaiola e libertar esse fantasma foi maravilhoso. Pessoas mudam, memórias mudam. Me sinto como um cubo mágico que tem mais uma de suas faces montadas. Ainda há muitos quadradinhos para serem postos no lugar. Mas no momento, uma de minhas faces faz sentido.


Claro que essa história não é sobre mim. Essa é uma história de como o outro é importante. Uma história escrita à várias mãos. Sem Lukas Martt, Kayke Magalhães não teria havido a quinta-feira passada. Sem Noyanne Resende não teria havido a quinta-feira passada. Olhando vocês, em silêncio, durante esse processo eu reescrevi essa historia. Como na música, eu questionei: A insanidade ri, sob pressão estamos cedendo/ Não podemos dar a nós mesmos mais uma chance/ Por que não podemos dar ao amor mais uma chance?/ Por que não podemos dar amor?. O exemplo de vocês me mostrou que sim.


"'Cause love's such an old fashioned word

And love dares you care for

The people once edge of de night

And loves dare you to change our way of

Caring about ourselves"


Quem me assistiu na quinta viu mais do que alguém se equilibrando numa lira ou girando num tecido. Viu o renascer da minha crença em mim mesma.


Gratidão a todos!

 
 
 

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